.
.

22 de janeiro de 2010

mais...

Anna Wintour, da Vogue America, concorda com a SPFW que é preciso tomar medidas para se discutir a questão da saúde (magreza) das modelos

http://twitter.com/RevistaEpoca

Um assunto que insiste...

Dois artigos da Folha de São Paulo falam sobre a magreza das meninas/modelos no SPFW:

Moda tem que parar de sacrificar modelos

Chegou a um nível irresponsável e escandaloso a magreza das modelos nas semanas brasileiras de moda. As garotas, muitas delas recém-chegadas à adolescência, exibem verdadeiros gravetos como pernas e, no lugar dos braços, carregam espécies de varetas desconjuntadas. De tão desencarnadas e enfraquecidas, algumas chegam a se locomover com dificuldade quando têm que erguer na passarela os sapatos pesados de certas coleções.

Usualmente consideradas arquétipos de beleza, essas modelos já estão se acercando de um estado físico limítrofe, em que a feiura mal se distingue da doença.
Essa situação tem o conluio de todo o meio da moda, que faz vista grossa da situação, mesmo sabendo das crueldades que são impostas às meninas e das torturas que elas infligem a si mesmas para permanecerem desta maneira: um amontoado de ossos, com cabelos lisos e olhos azuis.

Uma rede de hipocrisia se espalhou há anos na moda, girando viciosamente, sem parar: os agentes de modelos dizem que os estilistas preferem as moças mais magras, ao passo que os estilistas justificam que as agências só dispõem de meninas esqueléticas. Em uníssono, afirmam que eles estão apenas seguindo os parâmetros de beleza determinados pelo “mercado” internacional -indo todos se deitar, aliviados e sem culpa, com os dividendos debaixo do travesseiro.

Alguns, mais sinceros, dizem que não querem “gordas”, com isso se referindo àquelas que vestem nº 36. Outros explicitam ainda mais claramente o que pensam dessas modelos: afirmam que elas não passam de “cabides de roupas”. Enquanto isso, as garotas emagrecem mais um pouco, mais ainda, submetidas também a uma pressão psicológica descomunal para manterem, em pleno desenvolvimento juvenil, as características de um cabide.

Um emaranhado de ignorâncias, covardias e mentiras vai sendo, assim, tecido pelo meio da moda, inclusive pelos estilistas mais esclarecidos, que não pesam as consequências do drama (alheio) no momento em que exibem, narcisicamente, suas criações nas passarelas. Para uma semana de moda, que postula um lugar forte na sociedade brasileira, é um disparate e uma afronta que ela exiba a decrepitude física como modelo a milhões de adolescentes do país.

Para a moda como um todo, que vive do sonho de embelezar a existência, a forma como os agentes e os estilistas lidam com essas moças é não apenas cruel, mas uma blasfêmia. Eles, de fato, não estão afirmando a grandeza da vida, mas propagando a fraqueza e a moléstia. O filósofo italiano Giorgio Agamben escreveu que as modelos são “as vítimas sacrificiais de um deus sem rosto”. É hora de interromper esse ritual sinistro. É hora de parar com essas mistificações da moda, que prega futuros ecológicos, convivências fraternais e fantasias de glamour, enquanto exibe nas passarelas verdadeiros flagelos humanos.


modelo desfilando no SPFW 2010

Hipermagreza domina passarelas da SPFW

“Gente, o que é isso, essa menina está doente?” A frase, de um fashionista sentado na primeira fila de um desfile da SPFW, ilustra um espanto recorrente na atual edição do evento: as modelos estão mais magras do que nunca. Prova disso é que estilistas estão tendo dificuldades em montar seus “castings”, fazem ajustes de última hora e escolhem peças estratégicas que escondam os ossos saltados das modelos.

Na SPFW da magreza radical brilham modelos na faixa dos 18 anos, que têm índice de massa corporal, calculado pela Folha, igual ao de crianças de 9 anos. No mundo dos adultos, a Organização Mundial da Saúde chama esse índice de “magreza severa”.

A explicação vem da top Aline Weber, 21, que mora em Nova York e participou do filme “Direito de Amar”, de Tom Ford. “Três coleções atrás, no auge do pânico antianorexia, as pessoas pesavam as modelos no backstage para ver se elas estavam saudáveis. Agora, a poeira baixou. Se você engorda um pouco, todo mundo está ali pra te julgar. Se você emagrece, falam que você está linda.” Aline diz conhecer muitas meninas bulímicas e anoréxicas fora do Brasil. “As russas são as piores”, conta.

O stylist David Pollak identifica o padrão supermagro europeu como uma das causas da onda que atinge a atual edição da SPFW. “Muitas meninas estão trabalhando fora e por isso estão supermagras. Estão dentro do padrão de Paris, que é esquelético.”

A magreza radical fez com que ele tivesse dificuldades na hora de montar o “casting” da Cavalera. “A marca tem uma imagem mais adolescente, saudável. Por isso, peguei meninas que não são badaladas [leia-se, as que ainda não têm carreira internacional]. Outros stylists tiveram de fazer o improvável: dispensar meninas de suas seleções porque elas estavam magras demais.
A onda tem feito eles inverterem uma antiga lógica da moda: ao invés de avaliarem roupas ideais para esconder, por exemplo, um quadril mais largo, têm de descobrir os looks que vão ocultar um corpo esquálido. “As meninas muito magras causam problemas. Seus ossos apontam num vestido de seda mais fluido. Ou seus corpos, muito estreitos, deixam a proporção toda estranha”, avalia o stylist Maurício Ianês.

Muito café

O estilista Reinaldo Lourenço não só percebe a hipermagreza das modelos desta temporada como também conta que teve que fazer hora extra por conta do fenômeno. “Tive que fazer vários ajustes de última hora em roupas que ficaram largas nas meninas, o que me deu o maior trabalho”, diz. Segundo ele, isso acontece porque a atual safra de modelos é “muito jovem”.
Nos camarins, longe da mesa de salgadinhos e quitutes -relegada aos jornalistas-, modelos desfilam com copos de café. “Identifico as mais magras como a turma do cafezinho, já que elas passam o dia todo tomando café para não comer e ficarem ligadas”, diz Pollak. Em entrevistas, elas escondem o peso e as medidas. “Não sei quanto peso. Nunca subo na balança”, disfarça uma delas.

Cristina Theiss, 18, jovem aposta da Ford Models, teoriza: “Para fazer passarela de inverno, precisa ser mais magrinha mesmo, porque as roupas são volumosas, enchem demais”. Para agências de modelos, o assunto ainda é tabu. Ou foi deixado de lado. “Magreza? Anorexia? Mas que assunto antigo, datado!”, diz um agente, interrompendo a entrevista da Folha com uma modelo. Basta olhar para as passarelas para ver que não é.”

21 de janeiro de 2010

Geração Zapping

Geração Zapping: tá ligado?

Crianças e jovens estão descobrindo novas maneiras de entender o mundo e se relacionar com base em avanços tecnológicos e transformações culturais.

Televisão, telefone, fone de ouvido, computador, MP3, Orkut, Twitter, Facebook, MSN, SMS. A conexão é on-line e os estímulos vêm de toda parte. No monitor do laptop ou no visor do celular incontáveis telas são abertas, reduzidas e fechadas em segundos. Surge uma nova linguagem, na qual a grafia das palavras é adaptada, simplificada, e prevalecem abreviações. A informação chega descontextualizada e truncada, inaugurando um novo jeito de compreender o mundo – e se relacionar, na horizontalidade do conhecimento – e caracterizando a chamada geração zapping (expressão de origem inglesa que se refere ao ato de mudar constantemente de canal).

Surge assim um novo jeito de pensar, graças à síntese de vários dados coletados de forma imediata e simultânea. O zapping tipifica justamente essa relação intensa e aparentemente inesgotável. Fragmentados os corpos, a informação e as relações, os jovens ficam à mercê dos estímulos, sem tempo para a introspecção e assimilação do bombardeio de conteúdos. O apelo ao mundo externo é intenso e vem de todos os lados.

Enquanto para a maioria daqueles que já passaram dos 30 anos a simultaneidade (tudo ligado ao mesmo tempo) é vivida como estressante, adolescentes parecem não se incomodar nem um pouco em receber vários estímulos concomitantes. Não por acaso, a expressão “tá ligado?” é bastante usada por aqueles que não chegaram a conhecer o mundo antes do computador.

São visíveis sua rapidez e destreza em localizar e selecionar informações, bem como esta agilidade em zapear o mundo, coletando os mais diversos dados, nas diferentes fontes.

O som permanece ligado enquanto leem, telefonam, trocam mensagens pelo computador, assistem à televisão. E, para desespero de muitos pais, até quando estudam. Por mais difícil que seja para alguns adultos compreenderem, o fato é que os jovens estabelecem uma forma singular de vínculo com o exterior: suas referências são de curta duração também pela necessidade de se diferenciar da maioria. Assim, modismos e cultos a ídolos deixam de ser parte do ideário de uma geração e passam a ser apenas objetos de diversão pura e simples. A expressão ídolo de uma geração pode não fazer mais sentido. A ideia do ídolo como símbolo de uma forma de pensar e viver ou modelo de identificação parece mais ligada a décadas anteriores. Assim como outros aspectos do cotidiano, o entretenimento é descartável e, como tal, passa rápido.

O rapaz que nas férias passadas era surfista poderá adotar o visual emo no próximo fim de semana, alterando rapidamente seus hábitos, pôsteres porventura afixados na parede, estilos musicais preferidos, locais que frequenta etc. Nesse momento em que a transitoriedade impera, não há estilos definitivos.

O mesmo ocorre com relação às drogas: entre a geração dos anos 60 e 70, por exemplo, o uso frequentemente estava associado à contestação e aos ideais de liberdade de expressão.

Atualmente, é mais um objeto de consumo, voltado ao prazer mais pragmático e objetivo. O psicanalista americano Christopher Lasch reconhece este momento como resultante de uma espécie de cultura de consumo, que acaba por debilitar a própria capacidade dos indivíduos de discriminar fantasia de realidade, já que, como em um caleidoscópio, surgem a todo momento novidades que despertam novas necessidades.

Todo indivíduo nesta sociedade parece ser elo de múltiplas redes de comunicação, informação, interpretação, divertimento, aflição e evasão. Os movimentos e centros de emissão estão dispersos, desterritorializados pelo mundo afora. Principalmente para jovens das classes mais baixas, com menos acesso às evoluções tecnológicas, a televisão oferece scripts sobre os papéis sociais, gênero, gratificação social, sexual, lazer, resolução de conflitos e valores. Publicado nos Estados Unidos, o relatório Growing up in the prime time: analyses of adolescent girls on the television examinou mais de 200 episódios de programas para adolescentes e constatou que a aparência deles é considerada mais importante que sua inteligência; meninas cultas que gostam de estudar são exibidas como socialmente desajustadas; elas são mais passivas que seus colegas do sexo masculino. E frequentemente o jovem é retratado como obcecado por compras, pela própria imagem, excessivamente voltado para a vida amorosa e pouco interessado em conversas sobre questões existenciais, acadêmicas ou mesmo profissionais. A falta de senso crítico, aliada à ideologia do consumo, tem gerado também uma tendência à banalização da posse material, uma vez que aparelhos tecnológicos acabam assimilados como móveis e utensílios da casa, e passa a importar pouco ao jovem onde as informações são obtidas, contanto que sejam acessíveis.

A rapidez e o fracionamento da informação são incorporados ao cotidiano dessa geração; o mergulho nessa realidade não se dá no meio, mas entre os meios. Valoriza-se a narrativa curta com significado quase imediato. Há uma aceleração temporal conciliada à fragmentação espacial. A televisão é considerada ao mesmo tempo invisível e onipresente, ainda que apareça como coadjuvante nos bares, restaurantes, no intervalo da escola e em vários ambientes da casa. É o jovem que capta dados nas incursões aos diferentes campos de informação quem vai construir um significado inerente ao fluxo dessas informações.


ESCOLA E FAMÍLIA
Dentro de um novo contexto social, instaura-se também um modelo de juventude. Relações familiares com nova conformação trazem outros referenciais ao adolescente. Os modelos e o conjunto do saber não advêm mais dos pais – pelo menos não necessariamente. A figura paterna está hoje mais diluída. O sociólogo francês Eugène Enriquez, ligado à psicossociologia e à sociologia clínica, considera que esse enfraquecimento está associado à incapacidade paterna de se situar no lugar da lei e de, consequentemente, desempenhar seu papel de interventor e polo de identificação. A criança e o jovem aprendem com os meios de comunicação de massa, com seu grupo de companheiros e com sua experiência pessoal. Também a escola tem deixado de exercer o papel de grande educadora; se o capitalismo valoriza uma relação clientelista, visando o lucro e estimulando o consumo, os alunos das escolas e universidades particulares são, em sua maioria, também atendidos sob essa perspectiva.

A proposta de satisfação imediata estende-se na relação família-escola, e a livre concorrência do mercado, direta ou indiretamente, autoriza as instituições a oferecer aos pais os instrumentos para esse nível de gratificação. É possível observar, em alguns casos, a tendência de um modus operandi empresarial por parte, inclusive, de algumas instituições educacionais, voltadas primordialmente ao lucro e aos investimentos que garantam o menor número possível de evasão dos alunos. Em consonância com as ideias do psicanalista Peter Blos, esta queda gradual e radical da convivência familiar – com reflexos na educação, nutrição, hábitos e preceitos morais – leva os pais a acreditar, cada vez mais, nas recomendações públicas que a mídia faz entrar nos lares. A tradição fica, então, substituída pelos especialistas que oferecem respostas para os problemas cotidianos. Isso favorece ainda mais o enfraquecimento da autoridade das figuras parentais, que muitas vezes abdicam de suas próprias convicções em favor de escolhas feitas por especialistas.

Na clínica de adolescentes, observa-se claramente a dificuldade dos pais em assumir uma posição de autoridade. A questão vem, muitas vezes, justificada por compromissos profissionais e o consequente sentimento de culpa em decorrência do afastamento do convívio diário. Esses fatores, aliados ao forte acesso aos meios de comunicação, especialmente a TV e a internet, têm levado algumas pesquisas a entender o comportamento dos jovens com base nesses novos referenciais.

A força e o poder da mídia permitem observá-la com características conceitualmente institucionais. Para Nicola Abbagnanno, autor do Dicionário de filosofia (2000), a instituição pode ser entendida como um conjunto de normas que regulam a ação social. Autores como o sociólogo G. Lapassande ressaltam que as instituições estão inseridas em um sistema social, vinculadas ao contexto político. A relação entre ideologia e instituição também se faz presente, considerando que todas as mediações institucionais atravessam a sociedade e determinam suas opções, preferências, rejeições e aspirações. O controle ideológico provoca o que o autor chama de desconhecimento social, fruto de mecanismos que interferem na educação, informação e cultura.

O vazio e a falta de perspectiva resistem à sociedade espetacular, pregadora da beleza e da felicidade. Elaborar, pensar e criticar são atos humanos que exigem uma postura ativa diante das experiências. Manter-se constantemente no papel de espectador remete à alienação e à passividade. Não é possível ignorar que a indústria do entretenimento, aliada aos valores do capitalismo, transforma todas as informações em show e, assim, realidade e fantasia se confundem. O educador americano Neil Postman vê o excesso de informação levando à impossibilidade de pensar: “Por pensar, entendo ter tempo e motivação para perguntar-me: Qual o significado deste acontecimento? Qual é sua história? Quais são as razões disso? Como isso se encaixa no que já sei do mundo?”, questiona.

O jovem hoje, por outro lado, pode estar desenvolvendo um novo modo de pensar, voltando à rapidez da capacidade de detectar a informação e sintetizá-la. Mas, assim como as informações zapeadas, sua mente, seu corpo e suas relações podem estar fragmentados, dificultando uma percepção mais apurada e cuidadosa, seja de seus sentimentos, seja das experiências que o mundo tão intensamente lhe oferece


Artigo da Mente&Cérebro