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27 de dezembro de 2009

Feliz Natal!

Mesmo com alguns dias de atraso... desejo a todos, que acompanharam o ViaFreud durante este ano, um Feliz Natal!


15 de dezembro de 2009

Nota no Rio Show sobre a exposição de Grete Stern.
Aproveite e veja mais algumas fotos!

"Interpretar, por meio de fotomontagens, os sonhos relatados por mulheres em busca de explicações para suas angústias. Esta foi a missão da fotógrafa Grete Stern, que, à pedido da revista feminina argentina Idilio, ilustrou, entre 1948 e 1952, a coluna El psicoanálisis le ayudará ("A psicanálise te ajudará"), assinada por Richard Rest, pseudônimo do psicanalista Gino Germani.

Das suas 148 criações oníricas publicadas, sobreviveram apenas 46 negativos, que permitiram ao curador Jorge Schwartz montar uma exposição que revela não só a verve surrealista da fotógrafa, ancorada na influência de artistas como Man Ray, Magritte e André Breton, mas um panorama da psique feminina argentina da época.

Exibida em São Paulo, no Museu Lasar Segall, a mostra "Os sonhos de Grete Stern - Fotomontagens" chega ao Rio nesta terça-feira e permanece em cartaz no Instituto Moreira Salles até o dia 17 de janeiro de 2010. Este ano, completam-se 10 anos da morte de Grete Stern, nascida em 1904."

A Psicanálise Vai Ajudá-la

Fotografia é uma das minhas grandes paixões! Não podia deixar de dar a dica da exposição de Grete Stern que chega no Rio amanhã:

Em 1936, fugindo do nazismo na Europa, a fotógrafa judia-alemã Grete Stern encontrou na Argentina, a terra de seu marido, o também fotógrafo Horacio Coppola, seu porto seguro. Em Buenos Aires, entre 48 e 51, realizou um trabalho sui generis para a Idilio - La Revista Juvenil e Femenina, uma publicação de grande circulação entre moças e senhoras: fotomontagens que saíam junto a relatos de sonhos enviados pelas leitoras e a interpretações de seu conteúdo, feita por dois psicanalistas. Parte dessa produção estará em exposição no Instituto Moreira Salles, no Rio, a partir de amanhã.


A seção se chamava A Psicanálise Vai Ajudá-la e as fotos, que remetem às vanguardas dadaísta e surrealista, invariavelmente têm na figura feminina a personagem central. Por vezes, Grete utilizava partes de fotografias já existentes; noutras, produzia novas. Tudo partia de um esboço a lápis, a partir do qual ela ampliava os negativos.



Do total de 140 fotomontagens publicadas na revista, só 46 negativos foram conservados. São essas fotos que estão expostas no IMS, na mostra Os Sonhos de Grete Stern: Fotomontagens. Trata-se da mesma exposição que ficou no Museu Lasar Segall de abril a junho. As imagens tentam dar conta de uma questão complexa, como ressalta o psicanalista João Frayze no catálogo: "A representação de um sonho representa o quê, a narrativa do sonhador ou a interpretação que dela faz o ouvinte? Grete Stern chegou perto dessa complexidade."



"É um trabalho muito inusitado, absolutamente original, não há nada semelhante. É interessante ver o papel que a psicanálise tinha em Buenos Aires ainda nos anos 40", aponta o curador, Jorge Schwartz, diretor do Lasar Segall. "Mais tarde, por volta dos anos 60, Grete passou a expor a série sem o contexto da revista, o que mostra que começou a vê-la como obra fotográfica artística, autônoma, sem que fosse instrumento de coisa alguma."


Em sua longa trajetória, Grete também trabalhou com publicidade e fez retratos de personalidades como o dramaturgo alemão Bertolt Brecht, o escritor argentino Jorge Luis Borges e o artista plástico brasileiro Flávio de Carvalho.

As informações são do jornal
O Estado de S. Paulo.

14 de dezembro de 2009

Freud analisa Deus

Pós-Graduação Lato Sensu (Especialização) na PUC - SP

Psicanálise e Linguagem: Uma Outra Psicopatologia

Este curso de Especialização, reconhecido pelo Conselho Federal de Psicologia, apresenta profunda reflexão sobre o conceito de "doença mental" e estabelece uma nova proposta nos campos do diagnóstico e do tratamento, oferecendo instrumentos teórico-práticos para a pesquisa e intervenção na área da saúde mental.

Discute a questão da nosografia utilizada em clínica psiquiátrica e as implicações do diagnóstico na direção do tratamento da "doença mental" diferenciando-a da clínica psicanalítica, cujos fundamentos teóricos são estabelecidos a partir do conceito de estrutura, o que permite questionar e redimensionar os conceitos de normal e patológico.

Será abordado o quadro geral da teoria da neurose em Freud, sua contribuição ao estudo das perversões e das psicoses e a relação entre a psicopatologia e psicanálise, aprofundada pela proposta de Jacques Lacan.

Uma nova articulação clínico-conceitual será proposta para as novas formas sintomáticas na contemporaneidade: anorexia, bulimia, alcoolismo, toxicomania, depressão, síndrome do pânico, fenômeno psicossomático, autismo, debilidade, patologias do bebê, patologias da adolescência, impulsões e compulsões e as crescentes e novas formas de violência.

A supervisão clínica, optativa e restrita para psicólogos com formação, tem como função a discussão teórico-prática dos atendimentos realizados no campo profissional, tanto no âmbito privado, como no âmbito institucional. A metodologia prevê aulas expositivas, seminários, palestras, com utilização de equipamentos audiovisuais.

Mais informações:

http://cogeae.pucsp.br/curso.php?cod=121610&uni=SP&tip=RE&le=L&ID=7

12 de dezembro de 2009

Debate

A Livraria da Travessa convida para o debate em torno do livro Nise da Silveira - Caminhos de Uma Psiquiatra Rebelde.
Com Lula Mello - Diretor do museu Imagens do Inconsciente , e Elvira Bezerra - Escritora

Dia 14/12, as 19:30, na Travessa do Ouvidor, 17 - Centro - Rio de Janeiro

sou cada pedaço infernal de mim

Mas se eu gritasse uma só vez que fosse, talvez nunca mais pudesse parar. Se eu gritasse ninguém poderia fazer mais nada por mim; enquanto, se eu nunca revelar a minha carência, ninguém se assustará comigo e me ajudarão sem saber; mas só enquanto eu não assustar ninguém por ter saído dos regulamentos. Mas se souberem, assustam-se, nós que guardamos o grito em segredo inviolável. Se eu der o grito de alarme de estar vivo, em mudez e dureza me arrastarão pois arrastam os que saem para fora do mundo possível, o ser excepcional é arrastado, o ser gritante.(...)Tudo se resumia ferozmente em nunca dar o primeiro grito - um primeiro grito desencadeia todos os outros, o primeiro grito ao nascer desencadeia uma vida. Se eu gritasse acordaria milhares de seres gritantes que começariam pelos telhados um coro de gritos e horror. Se eu gritasse desencadearia a existência - a existência de quê? A existência do mundo. Com reverência eu temia a existência do mundo para mim. (...) Eu com uma vida que finalmente não me escapa pois enfim a vejo fora de mim - eu sou minha perna, sou meus cabelos, sou o trecho de luz mais branca no reboco na parede - sou cada pedaço infernal de mim - a vida em mim é tão insistente que se me partirem - como uma largatixa, os pedaços continuarão estremecendo e se mexendo. Sou o silêncio numa parede, e a borboleta mais antiga esvoaça e me defronta: a mesma de sempre. De nascer até morrer é o que eu me chamo de humano, e nunca propriamente morrerei.

C. Lispector

11 de dezembro de 2009

A Feminilidade na obra de Freud - ESTE SÁBADO!

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Ultimas vagas!

PARTICIPE!


...Ambos

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...como se um indivíduo não fosse homem ou mulher, mas sempre fosse ambos - simplesmente um pouco mais de um do que do outro.


S. Freud
In: Conferência XXXIII - Feminilidade (1932)


Fotografia Robert Mapplethorpe
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9 de dezembro de 2009

Desejamos mais...

Damos festas, abandonamos as nossas famílias para vivermos sós no Canadá, batalhamos para escrever livros que não mudam o mundo apesar das nossas dádivas e dos nossos imensos esforços, das nossas absurdas esperanças. Vivemos as nossas vidas, fazemos seja o que for que fazemos e depois dormimos: é tão simples e tão normal como isso. Alguns atiram-se de janelas, ou afogam-se, ou tomam comprimidos; um número maior morre por acidente, e a maioria, a imensa maioria é lentamente devorada por alguma doença ou, com muita sorte, pelo próprio tempo. Há apenas uma consolação: uma hora aqui ou ali em que as nossas vidas parecem, contra todas as probabilidades e expectativas, abrir-se de repente e dar-nos tudo quanto jamais imaginámos, embora todos, excepto as crianças (e talvez até elas), saibamos que a estas horas se seguirão inevitavelmente outras, muito mais negras e mais difíceis. Mesmo assim, adoramos a cidade, a manhã, mesmo assim desejamos, acima de tudo, mais.

Michael Cunningham, in "As Horas"

Fotografia Chema Madoz


8 de dezembro de 2009

O Banquete

"...Mas é preciso primeiro aprenderdes a natureza humana e as suas vicissitudes. Com efeito, nossa natureza outrora não era a mesma que a de agora, mas diferente. Em primeiro lugar, três eram os gêneros da humanidade, não dois como agora, o masculino e o feminino, mas também havia a mais um terceiro, comum a estes dois, do qual resta agora um nome, desaparecida a coisa; andrógino era então um gênero distinto, tanto na forma como no nome comum aos dois, ao masculino e ao feminino, enquanto agora nada mais é que um nome posto em desonra. Depois, inteiriça era a forma de cada homem, com o dorso redondo, os flancos em círculo; quatro mãos ele tinha, e as pernas o mesmo tanto das mãos, dois rostos sobre um pescoço torneado, semelhantes em tudo; mas a cabeça sobre os dois rostos opostos um ao outro era uma só, e quatro orelhas, dois sexos, e tudo o mais como desses exemplos se poderia supor. E quanto ao seu andar, era também ereto como agora, em qualquer das duas direções que quisesse; mas quando se lançavam a uma rápida corrida, como os que cambalhotando e virando as pernas para cima fazem uma roda, do mesmo modo, apoiando-se nos seus oito membros de então, rapidamente eles se locomoviam emcírculo. Eis por que eram três os gêneros, e tal a sua constituição, porque o masculino de início era descendente do sol, o feminino da terra, e o que tinha de ambos era da lua, pois também a lua tem de ambos; e eram assim circulares, tanto eles próprios como a sua locomoção, por terem semelhantes genitores. Eram por conseguinte de uma força e de um vigor terríveis, e uma grande presunção eles tinham; mas voltaramse contra os deuses, e o que diz Homero de Efialtes e de Otes é a eles que se refere, a tentativa de fazer uma escalada ao céu, para investir contra os deuses. Zeus então e os demais deuses puseram-se a deliberar sobre o que se devia fazer com eles, e embaraçavam-se; não podiam nem matá-los e, após fulminá-los como aos gigantes, fazer desaparecer-lhes a raça - pois as honras e os templos que lhes vinham dos homens desapareceriam — nem permitir-lhes que continuassem na impiedade. Depois de laboriosa reflexão, diz Zeus: “Acho que tenho um meio de fazer com que os homens possam existir, mas parem com a intemperança, tornados mais fracos. Agora com efeito, continuou, eu os cortarei a cada um em dois, e ao mesmo tempo eles serão mais fracos e também mais úteis para nós, pelo fato de se terem tomado mais numerosos; e andarão eretos, sobre duas pernas. Se ainda pensarem em arrogância e não quiserem acomodar-se, de novo, disse ele, eu os cortarei em dois, e assim sobre uma só perna eles andarão, saltitando.”
Logo que o disse pôs-se a contar os homens em dois, como os que cortam as sorvas para a conserva, ou como os que cortam ovos com cabelo; a cada um que cortava mandava Apolo voltarlhe o rosto e a banda do pescoço para o lado do corte, a fim de que, contemplando a própria mutilação, fosse mais moderado o homem, e quanto ao mais ele também mandava curar. Apolo torcia-lhes o rosto, e repuxando a pele de todos os lados para o que agora se chama o ventre, como as bolsas que se entrouxam, ele fazia uma só abertura e ligava-a firmemente no meio do ventre, que é o que chamam umbigo. As outras pregas, numerosas, ele se pôs a polir, e a articular os peitos, com um instrumento semelhante ao dos sapateiros quando estão polindo na forma as pregas dos sapatos; umas poucas ele deixou, as que estão à volta do próprio ventre e do umbigo, para lembrança da antiga condição. Por conseguinte, desde que a nossa natureza se mutilou em duas, ansiava cada um por sua própria metade e a ela se unia, e envolvendo-se com as mãos e enlaçando-se um ao outro, no ardor de se confundirem, morriam de fome e de inércia em geral, por nada quererem fazer longe um do outro. E sempre que morria uma das metades e a outra ficava, a que ficava procurava outra e com ela se enlaçava, quer se encontrasse com a metade do todo que era mulher - o que agora chamamos mulher — quer com a de um homem; e assim iam-se destruindo. Tomado de compaixão, Zeus consegue outro expediente, e lhes muda o sexo para a frente - pois até então eles o tinham para fora, e geravam e reproduziam não um no outro, mas na terra, como as cigarras; pondo assim o sexo na frente deles fez com que através dele se processasse a geração um no outro, o macho na fêmea, pelo seguinte, para que no enlace, se fosse um homem a encontrar uma mulher, que ao mesmo tempo gerassem e se fosse constituindo a raça, mas se fosse um homem com um homem, que pelo menos houvesse saciedade em seu convívio e pudessem repousar, voltar ao trabalho e ocupar-se do resto da vida. E então de há tanto tempo que o amor de um pelo outro está implantado nos homens, restaurador da nossa antiga natureza, em sua tentativa de fazer um só de dois e de curar a natureza humana. Cada um de nós portanto é uma téssera complementar de um homem, porque cortado como os linguados, de um só em dois; e procura então cada um o seu próprio complemento..."

Lendo este trecho de O Banquete, de Platão (428/7-348/7 a.C.), me lembrei de um filme independente, adaptação da aclamada peça homônima do circuito off-Broadway chamado Hedwig and the Angry Inch de 2001, onde essa história é contada de uma maneira bem Pinkfloydiana: um musical com cenas de animação. Mostrando, na verdade, o quanto este Platão de 400 a. C. é contemporâneo e atual.



Programação de verão da Casa do Saber

A Casa do Saber já está divulgando sua programação de verão!

Veja os cursos:
O MAL-ESTAR NA CIVILIZAÇÃO CONTEMPORÂNEA - UMA SOCIEDADE DE PERVERSOS? - Os objetos tecnológicos oferecem ao sujeito de hoje a possibilidade, ainda que transitória, da recusa do sofrimento e da negação da morte. O mecanismo da “recusa”, de acordo com o pensamento de Freud, é a base do funcionamento da perversão. Este curso vai observar as características da subjetividade atual à luz das idéias da psicanálise. Tal estratégia servirá para investigar - diante do argumento de que o perverso, sendo amoral, não sofre de culpa - a qualidade específica do padecimento psíquico típico de nosso tempo e a pertinência de uma clínica psicanalítica para tratá-lo.

NIETZSCHE PARA O SÉCULO XXI - UMA NOVA AVENTURA PARA O PENSAMENTO
A filosofia de Nietzsche atravessa os séculos para interpelar nosso tempo. Imersos no excesso de informações que se sucedem velozmente, desafiando nossa memória, questões relativas ao corpo, à finitude e à memória nos inquietam especialmente. Nesse contexto, parece fundamental suspeitar de nossos valores e inventar novas perspectivas éticas. A leveza e a alegria da criança, em sua relação com o tempo e com a vida, perpassam a filosofia de Nietzsche, inspirando uma nova aventura para o pensamento, o que é a proposta principal deste curso.

Informações:
Tel.:
(21) 2227-2237 ou 222-SABER
Horário de funcionamento: segunda a sexta: 11h às 20h
inforio@casadosaber.com.br

Este sábado!

3 de dezembro de 2009

Consumo, logo existo

Artigo da Mente&Cérebro:

Comprar exageradamente pode ser uma forma patológica de aplacar angústias; muitas vezes, a compulsão é “sazonal”: festas de fim de ano e férias convidam ao consumo excessivo

Diante de um mercado forte e diversificado, o homem da sociedade contemporânea é continuamente bombardeado por sedutoras peças publicitárias, que prometem bem-estar, status, conforto, projeção imediata e ilusão de segurança. Com a chegada das festas de fim de ano, a lógica do “consumo, logo existo”, segundo a qual o bem-estar é conquistado pela aquisição de produtos, se torna ainda mais evidente. Em casos extremos, a compulsão por compras pode se tornar patológica.

Dois psiquiatras, o alemão Emil Kraepelin (1856-1926) e o suíço Eugen Bleuer (1857-1939), foram os primeiros a escrever sobre o comprar compulsivo (ou oniomania), no início do século XX.Para os pesquisadores, levar em conta a dificuldade de controlar o impulso é elemento essencial para compreender o quadro. Eles observaram que algumas mulheres com esse diagnóstico buscavam excitação, assim como os jogadores patológicos. O tema caiu no esquecimento nos anos seguintes e foi retomado de forma mais intensa na década de 90. O transtorno, porém,ainda não é considerado uma doença pela Organização Mundial da Saúde (OMS).



Segundo a psicóloga Tatiana Filomensky, do Ambulatório dos Transtornos do Impulso do Hospital das Clínicas, a pessoa que sofre de compulsão experimenta uma forte ansiedade que só é aliviada quando faz a compra. “Ela não consegue controlar um desejo intrusivo e repetitivo. O ato é imediatamente seguido por intenso sentimento de alívio.” Em situações de impossibilidade

de comprar podem aparecer sintomas como irritação, sudorese, taquicardia, tremor e sensação de desmaio iminente. Algum tempo depois de adquirir a nova mercadoria, porém, surge a sensação de remorso e decepção diante da incapacidade de controlar o impulso. Numa atitude compensatória, o mal-estar causado pela culpa leva a pessoa a comprar novamente, dando continuidade ao círculo vicioso.

Numa sociedade que estimula o máximo consumo e a satisfação do prazer imediato, a compulsão por compras não é notada tão prontamente pela família, diferente do que ocorre com de outras dependências, como o abuso de drogas. Por isso, quem sofre do transtorno leva muitos anos para reconhecer o caráter patológico do seu comportamento. Mas quando isso acontece, a pessoa sente vergonha por não vencer a batalha contra o impulso – e, assim, o transtorno pode ser mantido em segredo por anos a fio.

Segundo a psicóloga Juliana Bizeto, coordenadora do Ambulatório de Dependências Não Químicas, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), a avaliação do problema não é feita com base na quantidade de dinheiro gasto. Isso, por si só, não constitui evidência para diagnóstico, mas sim prejuízo que o comportamento pode causar na vida da pessoa, já que ela passa a negligenciar atividades sociais importantes como trabalho e família. “O que deve ser considerado é a relação do paciente com a compra. Para o compulsivo, o único prazer está no ato de adquirir, ele não pretende usufruir do objeto: é um comportamento vazio”, afirma. Há, portanto, uma restrição do prazer, um empobrecimento social e uma queda da qualidade de vida, já que a pessoa se torna apática diante de outros estímulos.”

Em sua tese de doutorado, Juliana Bizeto investiga os fatores de risco que estão envolvidos com o surgimento de dependências não químicas. Com base em dados de uma pesquisa realizada com pacientes compulsivos atendidos pelo Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes (Proad), da Unifesp, ela constatou que um aspecto de grande importância é a falta de inserção social. “A pessoa que não está inserida em um grupo social, seja no trabalho, na família ou na igreja tem maior possibilidade de desenvolver algum tipo de dependência, seja por compras, jogos, sexo ou internet”, observa.

O artigo “Compulsive Buying. Demography, Phenomenology and comorbidity in 46 subjetcs”, publicado pelo periódico Gen Hosp Psychiatry em 1994, mostra que 94% dos compradores compulsivos são mulheres. Juliana ressalta, porém, que a presença do transtorno na população masculina pode estar subestimado. “Não sabemos se as mulheres são realmente as maiores vítimas ou se são as que mais frequentemente procuram o serviço de saúde. Em alguns casos, a gravidade do quadro é ainda mais acentuada nos homens porque eles demoram a buscar tratamento e, quando isso acontece, chegam ao ambulatório muito comprometidos”, ressalta.

Veja o artigo na íntegra aqui.

2 de dezembro de 2009

Elas não são gays!

Vi no blog Significantes e me chamou atenção por tem muito do que foi discutido, em algum momento, no grupo de estudo que participo as quartas à noite.

Michele e Carla são casadas, têm filhos, mas afirmam não ser homossexuais


Quando conhecem alguém, Michele Kamers e Carla Cumiotto fazem questão de se apresentar sem deixar nada por dizer: “Somos casadas, fizemos inseminação artificial em São Paulo e temos dois filhos”. Elas preocupam-se em deixar tudo claro por acreditar que são as dúvidas e sombras que alimentam maledicências e preconceitos. E, como formaram uma família diferente do padrão convencional, querem que seu casal de filhos cresça numa sociedade preparada para recebê-los. Conheci essas mulheres extraordinárias dias atrás, quando as procurei com a proposta de contar sua história. O resultado desse encontro é a reportagem "A primeira nova família brasileira", publicada na atual edição de ÉPOCA.

Michele e Carla conquistaram na Justiça o direito de registrar seus gêmeos, de 2 anos, no nome de ambas. Até agora só tinham o sobrenome de Carla, a mãe biológica. Michele não aceitava a ideia de ter de entrar com um pedido de adoção. Ela desejou esses filhos, acompanhou o processo de inseminação, via banco de esperma, esteve ao lado de Carla durante toda a gestação e no parto por cesariana, e cria junto com Carla os dois filhos na casa que ambas compraram. “Eu não poderia adotar meus próprios filhos”, diz. “Eles nasceram do meu desejo, tanto quanto do de Carla.”

É a primeira vez que a Justiça brasileira reconhece um vínculo exclusivamente afetivo, simbólico, como parental. Não há nenhum traço biológico ligando os gêmeos a Michele. Mas ninguém que conhece a família, assim como o juiz Cairo Roberto Rodrigues Madruga, da 8ª Vara de Família de Porto Alegre, tem qualquer dúvida sobre o fato de eles serem tão filhos de Michele quanto são de Carla. A surpresa é que uma das maiores vitórias na área dos direitos dos LGBTTTS é de um casal de mulheres que afirma não ser homossexual – não por preconceito, mas porque acreditam que a questão é mais complexa do que parece. A sigla, cada vez maior porque há sempre uma nova diferenciação a incluir, significa Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais, Trangêneros e Simpatizantes.

Quando Carla e Michele disseram-me que não se identificavam como homossexuais, meu primeiro sentimento foi de estranhamento. Até então eu me considerava heterossexual – uma definição que identifica pessoas que costumam viver suas histórias de amor com o sexo oposto, mas que raramente é usada porque ninguém precisa ficar afirmando algo que é o convencional – e, principalmente, que é aceito. E homossexual era todo aquele que vivia relações afetivas e sexuais com o mesmo sexo. Simples assim.

Pelos amigos gays e por algumas reportagens que gostaria de ter feito, sempre soube que os arranjos eram muito mais complexos e interessantes do que isso. E que, ao reduzir a diferença a uma palavra ou mais palavras fechadas em seu significado, perde-se de vista um universo pleno de nuances. E nós, ditos heterossexuais, também somos reduzidos a algo que parece muito óbvio – e que de fato não é, ou pelo menos espera-se que não seja. Mas nunca fui provocada a pensar tanto assim no assunto.

Ao entrevistar o casal em sua casa, em Blumenau (SC), seus argumentos me levaram a uma série de novas questões. Ao final do primeiro dia, eu e o fotógrafo Marcelo Min pedimos uma garrafa de vinho, no hotel, e ficamos conversando sobre as tantas perguntas inusitadas que a reportagem nos provocava. Esse é sempre o melhor cenário para um repórter e para um fotógrafo que amam o que fazem: quando a pauta se mostra muito mais complexa do que parecia e nos desafia, também do ponto de vista pessoal, a indagações inéditas. Acredito que uma reportagem só acontece quando repórteres e personagens se transformam nesse encontro. E espero ter colocado nelas quase tantas pulgas quanto elas me colocaram.

Carla e Michele são psicanalistas, professoras universitárias, que pensam bem e têm um ótimo senso de humor. Formam um casal mais tradicional do que a maioria dos casais convencionais que eu conheço. Cada uma delas tem uma papel bem definido na relação: Michele ocupa a posição masculina e Carla a feminina – entendendo tanto o feminino quanto o masculino nas definições tradicionais inscritas na cultura. Carla sempre namorou homens – masculinos – e Michele é a primeira mulher de sua vida. “Não posso me identificar como homossexual porque sou atraída pela posição oposta”, diz Carla. “Gosto de homens e mulheres masculinos. Jamais beijaria uma mulher ou um homem feminino.” Na rua, Carla segue olhando para homens e, em geral, observa uma mulher quando se interessa por seus sapatos, bolsas ou roupas.

Michele namorou gente de ambos os sexos durante a adolescência, mas acabou fixando-se em mulheres femininas na vida adulta. Quando viu Carla, sua professora no curso de Psicologia, encantou-se pelo vestido justo, de um ombro só, e pelas unhas vermelhas. Ela mesma está bem longe do que seria o esterótipo de uma mulher masculina. Michele é bonita, veste-se com estilo, inclusive usando vestidos justos nas festas, usa brincos, colares e maquiagem, tem luzes no cabelo pelos ombros. Mas, por um sentimento intangível, qualquer um que se aproxima dela sabe que ela é masculina, mas não no sentido de se parecer a um homem, mas masculina como só uma mulher pode ser.

E, para ciúmes de Carla, que descobriu-se com a novidade de um marido circulando predominantemente entre mulheres, Michele mesmo sem querer desperta paixonites entre garotas homo ou heterossexuais. Mas também não consegue ver-se como homossexual. “Hoje existem diversos modos de ser mulher, inclusive ser mulher e ter uma posição masculina. Do mesmo modo que é possível ser um homem na posição feminina. Não é preciso cortar o pênis para ter um lugar social. Muita gente, ao mudar de sexo, está resolvendo na anatomia uma questão psíquica, uma questão de reconhecer-se no corpo que se tem”, diz. “Acho que uma mulher precisa ser muito mulher no sentido de não ter medo de ser confundida com um homem. Me vejo como uma mulher masculina que gosta de mulheres femininas.”

Michele Kamers e Carla Cumiotto

Carla e Michele não frequentam guetos gays, como bares, restaurantes e danceterias. A maioria de seus amigos poderia ser identificada como heterossexual. “Todo o gueto – e não apenas o homossexual – visa excluir a diferença. Seja ele ideológico, religioso, racial ou sexual”, diz Michele. “E nós acreditamos que é o confronto com as diferenças que nos faz avançar, que nos apresenta novas possibilidades de existir, que nos permite a invenção de uma vida melhor. Nas ocasiões em que tentaram eliminar as diferenças, determinar que só existia uma forma de viver, foi muito triste, como no nazismo e no fascismo.”

Como a questão de ser ou não homossexual tangenciou as cinco horas de entrevista, Carla e Michele ainda me enviaram um email, com o objetivo de clarear sua posição. É Carla que escreve primeiro: “Não nos reconhecemos como homossexual justamente por que, ao se apresentar como ‘homossexual’ nos parece que o sujeito reduz e condensa o conjunto de traços identificatórios que o define a apenas um: ‘o homossexual’. Ou seja, como se a partir desse momento deixasse de ter nome próprio, de ser filho, de ter uma profissão, de ter uma identidade de homem ou mulher. Somos mulheres e entendemos que, na vida, se é homem ou mulher. Para depois, a partir das determinações discursivas da época em que se vive, assim como a partir das marcas infantis, e assim como dos ‘bons encontros’ na vida, cada um vai se referenciando a partir do masculino ou do feminino enquanto posição psíquica. E isso vai determinar seu jeito de amar, de namorar, de fazer laço, etc. Por exemplo: No primeiro dia em que ficamos, quando fui tocar o corpo da Michele, me surpreendi que não tinha um pênis. Isso é só para te inspirar e te dar um exemplo de que o quanto o conhecimento da anatomia e da realidade é menos determinante que a dimensão do simbólico enquanto representação. Isso é para brincar um pouco do quanto existem mil e um ordenadores e arranjos possíveis no campo da sexualidade e, principalmente, uma infinidade de arranjos possíveis para um casal”.

O texto continua, desta vez escrito por Michele. “Gostaríamos de deixar uma interrogação: o que é apresentar alguém como homossexual, na medida em que nunca vimos alguém se apresentar como heterossexual? Ou ainda, como poderíamos aceitar essa representação se a idéia do homossexual faz alusão à atração pelo mesmo sexo, se o encontro entre mim e Carla diz justamente da atração pela diferença de posição? Ou seria o estereótipo ‘homossexual’ uma forma de anular a reflexão e de manter a ilusão de que não temos ‘nada’ comum para fazer laço?”.

Considerei as questões colocadas por elas tão interessantes que quis trazê-las para essa coluna. Tudo o que nos provoca a pensar sempre nos faz avançar. Concordar ou discordar não é o mais importante. Acho que as pessoas dão valor demais ao “concordo” ou “discordo” – e assim perdem ótimas oportunidades de aprimorar sua reflexão porque sentem-se ameaçadas quando algo abala suas convicções. Provocações intelectuais valem a pena porque nos fazem refletir para além do que pensávamos antes – e tornam possível chegar a questões que também superam as iniciais. Valem a pena porque nos fazem duvidar de nossas certezas. E esse é um excelente exercício para nos tornarmos pessoas melhores, que pensam mais e melhor e conjugam a tolerância. Se o método servir para alguém, sempre que algo me parece muito novo ou mesmo absurdo, eu faço um exercício que começa por um silencioso, mas nem por isso menos sonoro: “Será?”.

É necessário ressaltar que a denominação homossexual e seus derivativos foram usadas por muito tempo para discriminar. Até pouco tempo o “homossexualismo” era considerado uma patologia, um desvio. E há quem ainda defenda essa teoria. Por outro lado, com imensa coragem e obstinação, o movimento gay conseguiu transformar uma definição que era pejorativa em ação afirmativa, fundamental para a conquista de direitos. Foi preciso afirmar a diferença para conquistar o direito de existir. Fechar-se em guetos se impôs como um espaço de proteção diante de uma sociedade preconceituosa – e uma estratégia para encaminhar as questões legais com maior poder de pressão. Hoje, o próprio desdobramento da sigla LGBTTTS, que não para de aumentar em função de novas definições, mostra um caminho de abertura. O trinômio GLS (gay, lésbicas e simpatizantes) não abarca mais todas as diferenças. E possivelmente teremos uma sociedade melhor quando as diferenças não precisarem mais ser explicitadas numa sigla.

É por esse caminho que me parecem ir Carla e Michele. Elas não ocultam nenhum elemento de sua condição. Pelo contrário, apresentam-se com uma transparência pouco vista, mesmo em militantes da causa. É preciso observar ainda que elas não circulam por guetos, mas na universidade, na escola dos filhos, nos restaurantes da cidade, no clube, nos próprios consultórios. E não em São Paulo, uma cidade que pelo tamanho permite a vivência de todos os arranjos – mas em Blumenau, uma cidade de porte médio, conservadora, com população predominantemente de origem alemã.

Ao escutar a argumentação de Carla e Michele, fiz várias indagações sobre minha vida e analisei meus arranjos amorosos em retrospectiva. Provavelmente eu nunca lidaria bem com um parceiro com uma posição masculina tão determinada. Percebo que tenho muito forte em mim as duas posições – e as alterno nos jogos amorosos e sexuais. Homens muito masculinos ou femininos demais acabam por me desinteressar. Sou atraída por gente que mistura, me fascino pelas nuances. E provavelmente por isso meu casamento tenha sobrevivido não às pequenas, mas a pelo menos uma grande crise.

Gosto, numa história de amor, da liberdade de ser uma coisa e outra. E, embora já tenha me sentido atraída por mulheres – femininas e masculinas –, nunca aconteceu. O que não significa que não acontecerá. E me exponho aqui em reciprocidade à exposição dessas duas mulheres, que entenderam que tinham a responsabilidade ética de se mostrar, para que outros brasileiros pudessem refletir sobre uma questão tão importante. Não acho que meu jeito é melhor que o de ninguém – nem que o de Michele e Carla sejam melhores ou piores que todos os outros possíveis. Acredito apenas, por tudo que vi, ouvi e senti, que elas formam um casal interessante e criaram uma família bonita.

Saí dessa experiência de reportagem com apenas uma convicção pessoal. Não sou heterossexual. Não porque pretenda começar a namorar mulheres, mas porque cheguei a conclusão de que essa definição diz muito pouco sobre a complexidade do que somos. Está na hora de criar nomes mais fluidos, acho eu. Se alguém me perguntar se sou homo ou hetero, vou dizer: “Sou uma mulher às vezes masculina, às vezes feminina, que gosta de homens às vezes femininos, às vezes masculinos”. É mais complicado, sem dúvida. Mas é bem mais estimulante. E libertador.


Eliane Brum - Revista EPOCA

Veja a história toda aqui

25 de novembro de 2009

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"Visto-me para ocasiões, para personagens. Há mulheres em meu armário, penduradas em meus cabides, uma mulher diferente para cada terninho, cada vestido, cada par de sapatos.
Acumulo roupas. Minha maquiagem transborda das gavetas do banheiro, e há mulheres diferentes para batons diferentes."

Marya Hornbacher
In Dissipada


Fotografia Helmut Newton

Ciclo de Debates no Rio de Janeito


TEMAS DO MÊS:

OS EFEITOS DA ESCRITA NA PASSAGEM AO ATO SUICÍDA
Lenita Bentes

Psicanalista, Membro da Associação Mundial de Psicanálise (AMP), Membro da Escola Brasileira de Psicanálise /Seção Rio, Mestre e Douturanda em Teoria da Clínica Psicanalítica pela UERJ, Coordenadora da Unidade de Pesquisa da UERJ.

MORTE E LUTO
Mirtha Ramirez

Psicóloga (05/9090), Psicanalista (CEP), Sócia, Psicoterapeuta Corporal em Análise Psico-Orgânica (CEBRAFAPO) Fundadora do Banco de Horas – IDAC, Membro Titular da Associação Brasileira de Análise Psico-Orgânica (ABRAPO.


Data:
27/11/2009

Hora: 6ª f. às 19:30

End: Rua Maria Eugênia, 215/sl. 201 - Humaitá/RJ

Informações: Comissão Cultural da ABRAPO
Tels: Silvana Sacharny: 2537-4081
Ana Luisa Baptista: 3062-3400

Contribuição: R$ 10,00

www.cebrafapo.com.br
contatocebrafapo@gmail.com

23 de novembro de 2009

Freud x Deus

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Clique para ampliar a imagem
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Lançamento

Recebi este email e repasso:

Lançamento de CADERNOS SOBRE O MAL, de Joel Birman, na Livraria Argumento, no Leblon, dia 26/11, às 20 hs.

Veja a divulgação do evento:

A excepcionalidade do mal

Em Cadernos sobre o Mal, Joel Birman age como historiador de pequenas causas, fazendo a anatomia de um novo tipo de mal na sociedade brasileira

Há uma zona nebulosa do tempo entre o que ainda não se escreveu como história e o que não é mais parte do presente imediato. Essa nebulosa é a matéria dos ensaios de Joel Birman sobre a experiência da brasilidade entre 2000 e 2007. Lendo-os em retrospectiva, percebe-se como o passado recentíssimo pode ser estranho e surpreendente. Seja por exigência de ofício, por disposição de método ou por escolha ética, o que o conjunto dos ensaios revela é a invenção, no Brasil da cultura pós-inflacionária, de um novo tipo de economia da violência. Por dever de ofício, Birman, um psicanalista no horizonte da subjetividade de sua época, recupera tanto a teoria da agressividade em psicanálise, depurando-a de seu moralismo conservador, quanto os caminhos da constituição de uma criminologia psicanalítica, com base em Aichhorn, Winnicott e Lacan. Isso inclui gradualmente corpo, ato e outro, como categorias centrais de um novo estilo de subjetivação e uma nova forma de mal-estar. Para fazer juz à radicalidade da pulsão de morte freudiana, entram em curso os recursos críticos de método necessários para reposicionar o debate sobre a violência. Nietszche, Foucault, Derrida e Agamben lembram-nos a estreita e obscena relação entre violência e poder, e o caráter inócuo senão indesejável de pensar um sem o outro.

Quando a segregação se torna gramática invisível do poder, a violência ganha visibilidade como ruptura e invasão de fronteiras. Quando a violência simbólica é derrogada, quer pelo Estado, quer pela sociedade civil, ela retorna disseminada como violência real. Violência real intensificada, sob a forma de crueldade, no tratamento da vida nua e no esquecimento da vida qualificada. O diagnóstico é circunstanciado: a inefetividade do registro político diante do econômico e o esvaziamento da vida pelo registro da performance precarizam a subjetividade e bloqueiam estratégias de reconhecimento, como a hospitalidade e a ética da amizade, que funcionariam como moduladores simbólicos da violência.

A genealogia da violência, assim desenvolvida, consegue escapar da retórica legalista, que vê no declínio da autoridade vertical de tipo paterna a fonte da violência e, por isso, só consegue pensar formas regressivas de recomposição da autoridade. Escapa também da retórica naturalista, que cultiva o desamparo e a maternagem como aspiração reificada de solidariedade. Ou seja, depois da banalidade do mal, a excepcionalidade do mal.


Sequestro de Patricia Abravanel, filha de Silvio Santos: a violência como demanda de reconhecimento e fama

Cultura pitbull e "sequestros relâmpagos"


Se na primeira parte dos Cadernos destacam-se as virtudes metódicas e teóricas de nosso autor, o returno do livro faz falar o cronista de uma época, o historiador das pequenas causas. São vidas simples, casos banais, contados com o que lhes falta, a saber, reconhecimento da dignidade. Por exemplo, a trajetória de um homem pobre que perde trabalho, esposa e família. Errante, mata cruelmente a menina que lhe oferece flores e comida. Violência inesperada contra a única pessoa que foi gentil com ele. Cinco anos de cárcere manicomial e escuta psicanalítica não foram suficientes para que ele, réu confesso e dócil, reconstruísse os rastros psíquicos dessa passagem ao ato criminal. Vazio e ausência de reconhecimento. Semelhança invertida com os soldados egressos do Iraque matando suas esposas... inexplicavelmente. Semelhança não simétrica entre vencidos e vencedores, como o grito de dor de As Troianas, tragédia de Eurípedes. Falsa equivalência que reaparece na crítica da ideia de que a guerra é a política feita por outros meios (tese de Clausewitz). O diagnóstico desconstrói as oposições fáceis dessa nova forma de violência: crueldade asséptica, crueldade excepcional, crueldade que não faz exemplos.

Não se trata apenas da banal identificação do criminoso com a exceção transgressora que funda a lei, mas da universalização da exceção em uma nova forma de lei. É o Império de um lado e Dogville de outro. Não é o futebol arte contra o futebol força, mas a permissividade dos árbitros universalizada pela corrupção dos cartolas; Maradona procurando a cura, mas não a salvação em Cuba; impactante retrospectiva política que nos apresenta página a página a gradual substituição do poder ostensivo e da violência visível, dos tempos de Antonio Carlos Magalhães, pelo poder invisível e pela violência excessiva, da era FHC e Lula; Estado burocratizado sem densidade afetiva e efetiva; o risco como valor ético básico (para o outro).

A cultura pitbull de nossos adolescentes, assim como a massificação das tatuagens, não tem mais de 15 anos. A aliança do PT com os evangélicos ou o oportunismo de Garotinho não têm mais de oito. A moda dos charutos Cohiba em Land Rovers turbinados não tem mais de quatro. Em seus pequenos ensaios, alguns tão breves que só podem vencer por nocaute, Joel descreve a emergência de um novo tipo de rico, e também de um novo tipo de pobre. Tipos sociais nos quais medo e desalento não se completam, assim como a depressão não se cura com a droga-dependência "excitativa". Personagens dessa nova lógica de condomínio, que a um tempo sitia favelas e casas, privatizando a segurança de ambos.
Entre o miserável e o mendigo profissional, assim como entre o sequestro da filha de Silvio Santos e a popularização da prática dos "sequestros relâmpagos", infiltra-se um elemento comum: a violência como demanda de reconhecimento e fama. Devolução ao remetente do gozo predatório de nossas elites. Não há, portanto, nenhuma banalidade aqui, mas desejo desesperado de engendrar uma excepcionalidade. Cadernos do Mal é um retrato em movimento da longa trajetória de reflexão de Joel Birman sobre os destinos da modernidade. Deve ser lido, com Arquivos do Mal-Estar e da Resistência (2006), como verdadeiro desafio à nossa capacidade de imaginação política e invenção psicanalítica. Se a ideologia é eterna, como disse Althusser, nosso passado recente não é.

II SIMPÓSIO DE PSICANALISE DE NITERÓI - Vídeos

O site Espaço Mulher On Line fez a cobertura do II SIMPÓSIO DE PSICANÁLISE.
Já está disponível um vídeo em 5 partes com um pouquinho do que rolou.
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Clique aqui e confira alguns trabalhos e entrevistas!

19 de novembro de 2009

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O maduro e sábio diz: sou inteiramente corpo, e nada mais; a alma é apenas uma palavra para algo no corpo.

Nietzsche
Assim falou Zaratustra
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17 de novembro de 2009

II SIMPÓSIO DE PSICANALISE DE NITERÓI


Algumas imagens do II Simpósio de Psicanálise...


As questões e comentários dos participantes...

As Psicanalistas Dayse Justos, Gertrud Friederich Frahm e Simone Aziz

Fernanda Pimentel, Fernanda Samico e Vivian Ligeiro

Flávia Albuquerque, Fernanda Pimentel e Silvia Mangaravite


Auditório cheio...

Veja mais no Pós Simpósio do Ponto Lacaniano

A Feminilidade na obra de Freud


Mais um seminário organizado por mim, que vai rolar ainda este ano.
O objetivo é discutir as questões relativas a feminilidade abordadas por Freud em sua obra. Trabalharemos em cima de seus textos, assim como textos de outros autores com o objetivo de enriquecer e esclarecer alguns pontos.

Seminário destinado a estudantes, psicólogos, psicanalistas, ou qualquer um que se interesse pelo tema.

Informações:
Fernanda Pimentel
Cel:(21) 8853-6697
fernandapimente.viafreud@gmail.com

II SIMPÓSIO DE PSICANALISE DE NITERÓI

O II Simpósio de Psicanálise de Niterói aconteceu neste último sábado e foi um evento incrível!
Gostaria de agradecer a todos os participantes, que só enriqueceram nosso evento com excelentes questões e comentários. Agradeço também aos palestrantes, que com muito carinho e atenção aceitaram nosso convite, sem falar dos trabalhos de altíssima qualidade!


Aproveito e, antecipadamente, já convido a todos para o III SIMPÓSIO, que será marcado para o final de 2010.

Participe! Vote, ao lado, no tema que você gostaria de assistir no III Simpósio!
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Aguardem!

13 de novembro de 2009

“Remédios não substituem psicanálise”


Entrevista com Marco Antônio Coutinho Jorge, psicanalista.

“As ondas o abalam mas não o afundam.” A frase estampada no brasão da cidade de Paris serviu, já em 1914, de epígrafe ao ensaio “A História do Movimento Psi­­ca­­nalítico”, escrito por Sigmund Freud.

Falsos obituários anunciando a morte da psicanálise eram contados às dúzias quando o austríaco ainda vivia. Não seria de se estranhar que os ataques à disciplina que ele fundou se intensificassem após sua morte. Mas também seus defensores resistem, convictos. Uma das principais, atualmente, é a historiadora e psicanalista francesa Elisabeth Roudinesco, de quem o brasileiro Marco Antônio Coutinho Jorge reuniu ensaios e entrevistas na coletânea Em Defesa da Psicanálise, publicada pela Zahar.

Diretor do Corpo Freudiano no Rio de Janeiro, Coutinho Jorge comenta, nesta entrevista, os ataques sofridos pela psicanálise por parte dos que se negam a aceitar o inconsciente. E, do outro lado, pelos adeptos da farmacologia indiscriminada, que evitaria a elaboração dos sentimentos e afetos. Fiel a Lacan, o psicanalista carioca sai em defesa de Freud.

Qual a sua ligação com a autora de Em Defesa da Psicanálise, Elisabeth Roudinesco? Como chegaram à ideia desta coletânea?
Dirijo a coleção Transmissão da Psicanálise, da editora Zahar, que já publicou um grande número de obras dela. Temos há anos contato pessoal e editorial. Esse livro nasceu de uma ideia que tive de reunir alguns de seus artigos, extremamente interessantes, que não haviam sido publicados no Brasil.

Por que a psicanálise precisa ser defendida hoje, no Brasil?
A psicanálise foi alvo de ataques desde o princípio. Quando Freud ouvia que a psicanálise acabaria, ele atribuía esses comentários mais ao desejo de que ela acabasse do que a qualquer outra coisa. Há dois tipos de ataques. Um diz respeito à própria essência da psicanálise. O fato de que nós, seres conscientes e racionais, venhamos a perceber que grande parte do nosso psiquismo é inconsciente não é facilmente aceito pelo ser humano, em seu orgulho e narcisismo. Freud comparava a consciência à ponta do iceberg (que é o inconsciente). É tênue, precária. Isso produz naturalmente uma resistência à psicanálise.

Qual seria a outra frente de ataque?
Um ataque muito específico do nosso momento contemporâneo é que temos, dentro da psiquiatria, uma vertente quase exclusivamente biológica, voltada para a psicofarmacologia, que de alguma forma recusa toda a contribuição da psicanálise.

Os remédios têm substituído a análise?
Há uma tendência nesse sentido. Mas os remédios não conseguem tomar o lugar da psicanálise. O que a gente critica é o uso indiscriminado e abusivo das substâncias psicotrópicas. A tristeza reativa a um evento ocorrido, natural, com frequência é vista pelo médico psiquiatra e até pelo psicólogo como sendo um sentimento que precisa ser eliminado, tratado com medicação e superado rapidamente. Enquanto para a psicanálise, sentimentos e afetos são importantes e não devem ser eliminados rapidamente, mas elaborados. Claro que há casos de depressão grave psicótica, como a melancolia, em que a medicação é absolutamente necessária. Mas veja a quantidade de antidepressivos que existem hoje, estamos na terceira ou quarta geração depois do Prozac.

As terapias cognitivo-comportamentais (TCC) também estão tomando o espaço da psicanálise?
No campo da psicologia, as terapias cognitivo-comportamentais são outra forma de oposição muito franca e até violenta em relação à psicanálise. Existe uma influência do pensamento médico americano, mais ou menos hegemônico no mundo, que caminhou para essa via organicista, biológica. Hoje existem, no mundo, mais de 700 formas de psicoterapia (que Roudinesco comenta no livro O Paciente, o Terapeuta e o Estado).

O senhor diria que é necessário, atualmente, sair em defesa de Freud?
Acho que sim. A obra do Freud é extremamente consistente, insuperável. Faço parte da escola lacaniana. O grande mérito de Lacan foi ter trazido novamente Freud para o primeiro plano, porque na década de 50 havia certa tendência na psicanálise de deixar Freud mais de lado e adotar teses de analistas pós-freudianos, norte-americanos sobretudo. Lacan fez um retorno a Freud que revigorou a psicanálise. Os analistas voltaram a abordar o texto freudiano na sua força e intensidade.
Toda psicanálise é tributária da obra de Freud. Analistas são todos discípulos de Freud. Alguns enfatizam mais uma parte ou outra da obra dele, porque é polifônica, tem diversas direções e assuntos. Freud era um homem de erudição ímpar – assim como Lacan. A obra dele não pode ser ultrapassada. Eu não jogaria nada fora. Mesmo o que possa ser considerado hoje um erro, é um erro sábio. O homem, depois de Freud, tem condições para se conhecer mais, a si próprio e à cultura humana em que vive.

Hoje, qual é a escola pós-freudiana de maior popularidade?
A escola de orientação lacaniana.

E ela não recusa Freud?
Ao contrário, o lacaniano é hiperfreudiano. Mais freudiano que os freudianos. Os seminários que Lacan deu por 30 anos foram todos feitos comentando Freud. O analista que segue Lacan no fundo segue Freud. No seminário de 1980, em Caracas, Lacan disse a seus discípulos que cabia a eles serem lacanianos: “Quanto a mim (Lacan afirmou), sou freudiano.”

Os conceitos de inconsciente, sexualidade infantil, pulsões e perversões, estabelecidos por Freud, permanecem?
Permanecem. Pulsão, por exemplo, é extremamente im­­portante, porque permite uma compreensão da sexualidade humana.

Li no Significantes

12 de novembro de 2009

Programação do II SIMPÓSIO DE PSICANÁLISE DE NITERÓI


09:00 ENTREGA DE MATERIAIS

09:40 – ABERTURA

Fernanda Pimentel – psicanalista, organizadora

Flávia Albuquerque – psicanalista, idealizadora e organizadora

09:50 – MESA I

SEXUALIDADE E AMOR: SUAS PERIGOSAS E DELICADAS LIGAÇÕES

Maurício Lima - graduado em História pelo Instituto de Filosofia e Ciências Sociais pela UFRJ, pós-graduado em História Antiga pela UFF, em formação permanente dos cursos introdutórios do ICP da Escola Brasileira de Psicanálise, e das Formações Clínicas do Campo Lacaniano da Escola de Psicanálise do Campo Lacaniano.

A SEXUALIDADE NO LEGADO DE FREUD

Isabella Leite – graduanda em Psicologia estagiária do SPA da UFF

11:00 – MESA II

LÓRI & ULISSES: A PAIXÃO PELO SABER DO (DES)ENCONTRO SEXUAL – CONSIDERAÇÕES SOBRE O ROMANCE “UMA APRENDIZAGEM OU O LIVRO DOS PRAZERES” DE CLARICE LISPECTOR

Flávia Albuquerque – psicanalista, pós-graduada em Teorias e Técnicas da Clínica Psicanalítica, foi membro da ELP-RJ

“MEU PALETÓ ENLAÇA O TEU VESTIDO…” ARTICULAÇÕES EM TORNO DO AMOR E SEXUALIDADE NA MÚSICA DE CHICO BUARQUE

Daisy Justus – Psicóloga, Psicanalista (foi membro do Colégio Freudiano do Rio de Janeiro), escritora, Mestre em Antropologia Social pelo Museu Nacional – UFRJ, participante Escola Letra Freudiana, coordena grupos de estudos em torno da articulação Literatura e Psicanálise, autora do livro O Vestido Grená

12:10 – ALMOÇO

13:30 – MESA III

LINGUAGEM E GÊNERO: INTERFACE COM A TEORIA DA SEXUALIDADE INFANTIL (INFANTO-JUVENIL?) DE FREUD

Gertrud Friederich Frahm – Linguista e Psicanalista Universidade Federal do Paraná

HOMOSSEXUALIDADE E NARCISISMO – PONTUAÇÕES SOBRE O TEMA

Simone Aziz – psicanalista, pós-graduada em Psicanálise e Laço Social na UFF e participante da Escola Letra Freudiana

14:40 – MESA IV

SOBRE A HOMOSSEXUALIDADE

Fernanda Pimentel - psicóloga, psicanalista, pós-graduada em Psicanálise e Laço Social pela UFF

HOMOSSEXUALIDADE FEMININA

Silvia Mangaravite psicanalista, membro-fundador da Escola Lacaniana de Psicanálise – RJ, membro-fundador do Espaço de Psicanálise de São Paulo

15:50 – COFFEE BREAK

16:30 – MESA V

A MASCARADA E O SEMBLANTE

Fernanda Samico Küpper - psicanalista, professora da Psicologia da Personalidade da Universidade Severino Sombra (Vassouras – RJ)

O AMOR FEMININO E OS SEMBLANTES

Vivian Ligeiro – psicanalista e mestranda do programa de pós-graduação da UERJ

17:50 – ENCERRAMENTO

10 de novembro de 2009

A Racionalidade Irracional



Eu digo muitas vezes que o instinto serve melhor os animais do que a razão a nossa espécie. E o instinto serve melhor os animais porque é conservador, defende a vida. Se um animal come outro, come-o porque tem de comer, porque tem de viver; mas quando assistimos a cenas de lutas terríveis entre animais, o leão que persegue a gazela e que a morde e que a mata e que a devora, parece que o nosso coração sensível dirá «que coisa tão cruel». Não: quem se comporta com crueldade é o homem, não é o animal, aquilo não é crueldade; o animal não tortura, é o homem que tortura. Então o que eu critico é o comportamento do ser humano, um ser dotado de razão, razão disciplinadora, organizadora, mantenedora da vida, que deveria sê-lo e que não o é; o que eu critico é a facilidade com que o ser humano se corrompe, com que se torna maligno.

Aquela ideia que temos da esperança nas crianças, nos meninos e nas meninas pequenas, a ideia de que são seres aparentemente maravilhosos, de olhares puros, relativamente a essa ideia eu digo: pois sim, é tudo muito bonito, são de facto muito simpáticos, são adoráveis, mas deixemos que cresçam para sabermos quem realmente são. E quando crescem, sabemos que infelizmente muitas dessas inocentes crianças vão modificar-se. E por culpa de quê? É a sociedade a única responsável? Há questões de ordem hereditária? O que é que se passa dentro da cabeça das pessoas para serem uma coisa e passarem a ser outra?
Uma sociedade que instituiu, como valores a perseguir, esses que nós sabemos, o lucro, o êxito, o triunfo sobre o outro e todas estas coisas, essa sociedade coloca as pessoas numa situação em que acabam por pensar (se é que o dizem e não se limitam a agir) que todos os meios são bons para se alcançar aquilo que se quer.
Falámos muito ao longo destes últimos anos (e felizmente continuamos a falar) dos direitos humanos; simplesmente deixámos de falar de uma coisa muito simples, que são os deveres humanos, que são sempre deveres em relação aos outros, sobretudo. E é essa indiferença em relação ao outro, essa espécie de desprezo do outro, que eu me pergunto se tem algum sentido numa situação ou no quadro de existência de uma espécie que se diz racional. Isso, de facto, não posso entender, é uma das minhas grandes angústias.

José Saramago, in 'Diálogos com José Saramago'