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19 de janeiro de 2009

Angústia

O que causa a angustia? De onde vem essa sensação arrebatadora, paralisante? O que e isso que nos faz perder o ar, tremer, suar e e tão difícil de nomear, de falar?
Tenho me deparado com frequência com questões relacionadas a angustia e sujeitos que se queixam de alguma coisa que parece da ordem do excesso...
Pesquisando sobre o assunto encontrei este artigo da psicanalista Tânia Coelho que aborda o tema da angustia.

A ANGÚSTIA E O SINTOMA NA CLÍNICA PSICANALÍTICA CONTEMPORÂNEA


Publicado em REVISTA LATINOAMERICANA DE PSICOPATOLOGIA FUNDAMENTAL, vol IV, número 1, 2001

1) De que desejo do Outro a angústia é o sinal?

Introdução
A angústia é o afeto (affekt) por excelência na clínica psicanalítica. De acordo com Freud é a matriz de todos os afetos. Para Lacan é o único que não engana: é o sinal da divisão do sujeito entre o gozo e o desejo. O que divide o sujeito é o significante. O sujeito, segundo Lacan, o recebe do Outro de quem depende absolutamente para conhecer o quer que seja acerca de sua necessidade. A demanda endereçada ao Outro retorna ao sujeito como desejo alienado, interpretado, pelo desejo do Outro. O significante, essa marca do desejo do Outro, impõe a um corpo uma exigência de trabalho: a de só poder reencontrar o gozo recorrendo novamente ao campo do Outro.
Freud surpreendeu-se com descoberta de uma estrutura inconsciente subjacente ao sintoma, primeira mentira histérica, em que a causa do desejo sexual é atribuída ao pai. E o que é o inconsciente senão o campo onde se elabora a fantasia? Somente por meio dela – na medida em que se serve dos significantes do Outro, da linguagem e da cultura - se pode sustentar a via do desejo no laço social. Esse último é, como outras formações do inconsciente, uma formação de compromisso entre o objeto perdido da pulsão e os significantes do Outro, da linguagem da cultura. Logo, só vem a se constituir enquanto efeito da separação que a fantasia introduz entre o gozo e o corpo. Por meio da fantasia, o gozo que é efeito da privação do sentido, consequência da dependência do homem do campo do significante, tem que reacionar esse circuito, reencontrar o campo do Outro, para efetivar a única realidade possível para seres de linguagem, a realidade psíquica ou o laço com o objeto. A fantasia inconsciente é esse operador estrutural necessário ao reencontro do objeto, ou dito de outro modo, à construção de um sintoma como uma modalidade de laço com o objeto. Incluímos na categoria de sintoma todo laço social, na medida em que implica um discurso e portanto a divisão do sujeito. Frequentemente, esse laço é insuficiente para regular o acesso ao gozo para um sujeito e lhe é preciso inventar outra coisa. O nome deste excesso é a angústia, um gozo deslocalizado, cujo objeto não se apresenta nas vias da interpretação, da máscara, do engano, do sintoma que é a via do desejo.
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2- O pai em Freud e em Lacan
Passamos a introduzir nossa discussão acerca de porque o desejo do pai é a causa do desejo para Freud e pára Lacan. Há uma relação de estrutura entre a função do pai em Freud no Complexo de Édipo e sua teoria da castração. Lacan (1969/70), diferentemente de Freud, não vincula a castração tão estreitamente ao Édipo, preferindo ancorá-la nos efeitos da linguagem sobre o vivo1.
Freud (1912) atribui o mecanismo psíquico do recalque à função do pai. O pai é o agente da castração, isto é, a identificação com o pai mantém o sujeito na via do desejo afastando-o da atração pelo objeto incestuoso. O pai faz a lei do que se deve desejar, isto é, outra coisa que não a mãe. Por essa razão o desejo primordial é parricida. O pai é aquele que se supõe ter acesso a um gozo do qual priva os filhos. O pai, em sua função simbólica de agente da castração é necessáriamente um pai morto. Como se vê, se o desejo é incestuoso, o gozo do objeto desse desejo, não é compatível com o vivo. O pai será, por essa razão o suporte dos ideais. Será lembrado como “o ao menos um” - que enquanto exceção à castração - orienta o gozo na direção do gozo fálico, do gozo útil, promovendo as virtudes vitorianas da renúncia pulsional. O mal-estar na civilização explica-se pelos efeitos de renúncia ao gozo, em conseqüência da identificação com a lei do desejo do pai.2
Lacan (1966) elevou a função do pai à de operador estrutural da constituição do sujeito enfatizando sua dimensão de significante da falta de gozo. Elevando o pai a uma metáfora da falta de gozo, Lacan promoveu também, ainda que paradoxalmente, a percepção de que o pai não passa de um semblante, um nome qualquer do que falta para que o gozo seja completo3.
Esse passo formal abre a possibilidade de pensar a clínica freudiana como referida a um tempo, a modernidade, em que o pai funciona como semblante da falta de gozo e que as neuroses histéricas e obsessivas dão testemunho de uma relação com o super-ego paterno. A formalização por Lacan da função do pai freudiano permitiu ver mais claramente como se distribuíam as estruturas neurose, psicose perversão em torno da primazia do nome-do-pai. Entretanto, o avanço do discurso da ciência e a difusão da psicanálise contribuíram para aprofundar o declínio do pai como metáfora da falta de gozo. A contemporaneidade nos confronta com uma nova clínica. Proliferam casos de difícil classificação, que nos incitam a repensar as fronteiras entre neurose e psicose.
Na modernidade, em conseqüência do advento do discurso da ciência, o nome-do pai deixou de ser um operador estrutural visível da ordem simbólica. Na nova ordem, em que todos os homens se eqüivalem, o nome do pai devém um resíduo. Sua função é limitada principalmente à esfera da família, e a alguns outros papéis sociais como, por exemplo, o do educador.
Freud conclui que a angústia é o sinal no psiquismo do retorno do recalcado. Ele a diferencia das formas automáticas de angústia que denotam um ausência de memória de experiências anteriores4. A função do nome-do-pai é o que possibilita inscrever no psiquismo uma explicação para a falta de gozo: o pai é o agente mítico da castração. O declínio da função paterna nos confronta com formas de angústia automáticas, afetação direta pelo real da falta de gozo, sem a mediação do significante do nome-do-pai. Sem a proteção, do imperativo paterno da renúncia à satisfação pulsional, o sujeito na contemporaneidade confronta-se, sem disfarce, com uma falta em gozar que não tem nome. Por essa razão, diante da falta de gozo, o sujeito é convocado a produzir uma resposta nova acerca do que falta para o Outro ser completo. Esse passo é absolutamente necessário para a constituição subjetiva, pois o sujeito hoje arrisca-se a se deixar aspirar por esse vazio cedendo à tentação de oferecer-se como objeto do gozo do Outro. É o que se verifica quando é preciso servir-se do abuso de drogas, do endividamento nos cartões de crédito, do consumismo desenfreado, da privação ou do excesso de comida ou, paradoxalmente, da adesão viciosa ao trabalho, para nomear aquilo que falta ao Outro, justamente, porque não se encontra mais o apoio no nome-do-pai. Para compreender esse ponto é preciso circunscrever como foi que o Nome-do-pai veio a ser identificado com a causa do desejo.
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