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21 de março de 2011

Crianças sem limites

Artigo do blog Mulher 7x7 escrito pela jornalista Cristiane Segatto

Coleira para criança, berço para cachorro

"Na última semana, tão fortemente marcada pela dor dos japoneses e pelas tentativas de evitar um desastre nuclear, uma notícia menor, à primeira vista sem maiores consequências, também mexeu comigo. Em reportagem publicada na Folha de S. Paulo, Mariana Versolato descreve a mais nova onda entre as mães de crianças pequenas: colocar os filhos na coleira

A guia para conter crianças é mais uma invenção neurótica importada dos Estados Unidos. Ela começa a ganhar adeptas nas ruas, nos shoppings centers, nos aeroportos brasileiros. O argumento para usá-la, tipicamente americano, é a garantia de conforto e segurança. A coleira não é colocada no pescoço. É um objeto de repressão travestido de acessório fofinho e infantil. A criança coloca uma mochilinha nas costas (alguns modelos vêm com um bichinho de pelúcia acoplado). Da mochila sai uma cordinha que a mãe segura para evitar que a criança se afaste demais. Como os cachorros espoletas, as crianças amarradas à coleira arrastam as mães.

Ainda não vi essa cena, mas posso imaginar o quanto de bizarrice há nela. Um garoto correndo pelo shopping obriga a mãe a dar pinotes enquanto ela grita, em vão: “Pare. Não corra. Aqui não. Eu disse para parar”. Se a mãe não consegue controlar o filho sem coleira porque ele deveria obedecê-la justamente na hora em que a situação parece perseguição de desenho animado? Imagino que a criança só poderia dizer: “De novo. Mais rápido. Outra vez”. E a cara da mãe quando o shopping inteiro comentar o vexame? Como dizem as meninas de 20 anos, isso “é muito vergonha alheia”. Mico total.



A vergonha é o que menos interessa nessa história. O que está implícito na decisão de comprar uma coleira? Os pais querem ter comodidade para olhar outras coisas sem se preocupar se os filhos estão por perto? É recurso para quem não consegue estabelecer limites? “A coleira é um instrumento ideal para quem não sabe dizer o que pode e o que não pode”, diz a psicoterapeuta Maria Teresa Lago. Se tivessem construído a autoridade que precisam ter, bastaria que os pais dissessem ‘não corra’, ‘fique quieto’, ‘aqui não é lugar para isso’. Essa autoridade é desafiada pelas crianças o tempo todo, mas é o tipo de embate do qual não se pode abrir mão. Dele depende a formação de um cidadão que aprende o que é aceitável e o que não é.

Segurar na mão da criança não seria mais simples, barato e natural? “Não pegamos os filhos pela mão só por pegar”, diz Maria Teresa. “Fazer isso é uma tentativa de tê-los conosco no sentido afetuoso da coisa.” A segurança que a mão do pai ou da mãe nos dá é um patrimônio emocional que não deve ser desprezado. Quem teve pai e mãe desempenhando seu verdadeiro papel provavelmente vai se lembrar, décadas depois, da mão que conduzia à sorveteria numa tarde de domingo ou que ajudava a atravessar a rua movimentada num dia cinza.

Enquanto o contato entre pais e filhos é substituído pela coleira, os cachorros ocupam o espaço que até há pouco tempo era exclusivo das crianças. A tentativa de humanizar os animais é estimulada pelo lançamento de produtos que - se não fossem tão pequenos -- poderiam ser vendidos em lojas de produtos para bebês. Há berço e carrinho de passeio para o pet que ganha nome de criança. A dona o chama, sem o menor constrangimento, de filhinho. “O cachorro é um prato feito para quem precisa ter uma garantia na relação.”, afirma Maria Teresa. “A garantia de afeto é total: quando o dono chega em casa o cachorro sempre vai pular no colo.”

Não vejo nenhum problema no amor destinado aos animais. Mas quem gosta deles deve amá-los pelo que são. Cachorro tem que ser amado como cachorro. Gato como gato. E não como o filho que não existiu ou que se foi. Ao tentar humanizar os bichos, os donos produzem aberrações. Sinto pena do cão quando o vejo vestido com roupinhas, enfeites de cabeça e outras peruices que o transformam numa cópia desajeitada da dona. Fico mais aflita ainda quando percebo que sofreram intervenções radicais ao bel-prazer dos donos.

Como se não bastasse cortar as unhas e arrancar as sobrancelhas dos bichos, chegam ao cúmulo de castigá-los pelos latidos. Vi na internet uma coleira antilatido que me deixou assustada. Ela funciona por meio do condicionamento pavloviano clássico. Quando o cachorro late, a coleira emite um sinal sonoro. Se ele latir outra vez nos trinta segundos seguintes, o aparelho apita e o coitado recebe um choque suave. A cada latido adicional, o choque se intensifica até ficar cinco vezes mais forte que o primeiro.

O cão é condicionado a ficar calado, aprende a não exibir nenhum sinal revelador de sua natureza. Os bem comportados ganham comida e afagos. E, dependendo do gosto e do exibicionismo da dona, ganha também uma coleira Louis Vuitton. “Vi num shopping do Leblon um cachorro que exalava perfume e tinha o pelo mais brilhante que o cabelo da dona. Ficava solto, deitado ao lado dela como se fosse uma criança”, diz Maria Teresa. “A humanização dos bichos é patológica, mas parece que ninguém reflete sobre isso.”

O mundo me espanta, me surpreende. Tenho mania de observar e refletir sobre pequenos sinais que parecem não dizer nada, mas que podem significar muito. Inversões de papéis me intrigam. Assim como invenções estranhas que prometem comodidade e vão se imiscuindo na nossa vida até parecer absolutante normais. Alguma coisa está fora do lugar quando colocamos a criança na coleira e o cachorro no berço."

16 de março de 2011

ViaFreud recomenda:

Recomendo o programa Dois Pontos da Psicológica TV.
Com uma linguagem bem dinâmica, o programa conta com um "profissional psi" que, numa entrevista, discorre sobre dois pontos teóricos importantes e a relação entre eles.

Destaco as entrevista maravilhosas com os queridos amigos e parceiros de estudo Flávia Albuquerque e Felipe Grillo, que falaram sobre Transferência e Amor no fim da análise e Identidade e Multiplicidade, respectivamente.

11 de março de 2011

Seminário: Anorexias e Bulimias

Dando início às atividades de estudo de 2011...




Participe!

Maiores informações:
Fernanda Pimentel
Cel: (21)8123-1472
fernandapimentel.viafreud@gmail.com
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Dá trabalho ser mulher?


Vejam o trabalho de Cibele Santos no blog http://mulhertrinta.blogspot.com

100.000 !

Queridos leitores,
Durante o Carnaval, no dia 6 de março, o ViaFreud completou 100.000 visitas!!!
Agradeço a todos os leitores e seguidores que acompanharam este percurso!

Rumo à 200.000!!!

Fernanda Pimentel

9 de março de 2011

Mais rótulo do que diagnóstico...

A campanha da CCHR critica o exagero de diagnósticos psiquiátricos que as crianças e adolescentes recebem frequentemente na atualidade: transtornos de deficit de atenção e hiperetividade, transtorno de humor e de personalidade, fobia social e até depressão.

Muitas vezes o que é visto como patologia é justamente o ponto onde a criança exerce sua singularidade e sua genialidade.

Assista o vídeo!




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3 de março de 2011

Anorexia também é coisa de homem!




.....Os casos de Anorexia em homens têm chamado cada vez mais atenção dos estudiosos no assunto. É verdade que sua existência foi questionada por H. Bruch em 1971, que atribuía à esses transtornos uma especificidade feminina e portanto, exclusivo das mulheres. Mas hoje, o grande número de casos de anorexia e bulimia entre os homens já não nos permite pensar assim.
.....Na realidade a Anorexia sempre existiu entre os homens. Os primeiros relatos clínicos de Anorexia, feitos por R. Morton em 1689 já incluíam um caso deste transtorno num homem. Em 1873, quando C. Lasegue formula o conceito de Anorexia, ele se baseava em dois casos clínicos: um no sexo feminino e outro no sexo masculino. Mas o número crescente deste transtorno alimentar entre as mulheres e o pensamento que anorexia era coisa de mulher fez os homens ficarem de lado nas estatísticas.
.....Pouco se falou sobre Anorexia entre os homens durante anos. Atualmente as coisas não são bem assim... O aumento da incidência de anorexia em homens vem ocorrendo em paralelo ao aumento do número de casos em mulheres, dessa forma o problema masculino tornou-se mais visível agora.


.....Desde a década de 70 começou-se a perceber um número cada vez maior de anoréxicos homens. Neste mesmo momento começou-se também uma maior valorização da estética masculina, e maior preocupação dos homens com o corpo. O que antes era uma preocupação típica feminina passou a fazer parte do universo masculino. Assim os homens foram incluídos nessa busca frenética pelo corpo perfeito e, como as mulheres, passaram a desenvolver distúrbios de auto-imagem e transtornos alimentares. O conceito de beleza no homem também começou a ser de um corpo mais longelíneo e os modelos de comerciais e passarelas cada vez mais magros, influencando o padrão de beleza masculino.




...............Modelos de desfiles recentes.
Não estão magros demais?

.....Os sintomas, o quadro clínico e a resposta ao tratamento é a mesma da encontrada nas mulheres. (Leia mais sobre Anorexia e Psicanálise aqui e aqui.) A questão da auto-imagem é um ponto de diferença. Os homens se percebem com menos distorções da imagem do próprio corpo que as mulheres. Outro fator importante é a presença de sobrepeso durante o início da adolescência. É comum nos casos de anorexia em homens um histórico de obesidade ou sobrepeso, além de zombarias e brincadeiras de outros meninos em relação ao seu corpo.
.....Alguns autores levantam a questão familiar, ressaltando uma relação “complicada” com o pai. O sintoma anoréxico poderia ser considerado uma maneira de se diferenciar deste pai que, geralmente, apresenta certo sobrepeso.
.....Atualmente estima-se que de 5 a 15% dos casos de Anorexia se apresenta em homens jovens (APA, 2000). Vários fatores contribuem para dificultar o calculo de estatísticas, o número de diagnósticos, e assim, o estudo da Anorexia na população masculina: o fato de ser um transtorno predominantemente feminino, o que leva os pacientes homens a terem uma dificuldade maior em procurar ajuda e até uma falta de preparo de profissionais em diagnosticar as especificidades da Anorexia entre os homens.
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Toda a literatura sobre transtornos alimentares em homens é marcada por controvérsias, dúvidas e buracos. Entretanto, já está claro que, atualmente, Anorexia pode ser coisa de homem sim e que devemos prestar mais atenção à estas condições graves e ainda muito pouco reconhecidas.